sexta-feira, 31 de agosto de 2007

ACRIMONIOSO

Por Rodrigo Lopez-Balthar


Vivo numa borda, num tempo-espaço entre o velho e o novo. Não é em uma fronteira. É um centro, mesmo assim borda. Passo pelo ex-boteco convertido em lounge-bar, acolhedor de uma fauna distinta da minha, não posso mais freqüenta-lo. Na padaria, hoje delicatessen, volto no tempo, peço: - um cigarro, por favor! Maço retalhado, ainda, como antigamente. Mas o gosto amargo vem travestido de novidade: sabor de menta.

domingo, 26 de agosto de 2007

Adidias

Por Carol Medrado

À primeira vista, ela se apaixonou. Fácil. Ela nunca esqueceria aquele dia. Ele usava uma bermuda Adidas preta que contrastava com os seus cabelos grisalhos, a chave do carro balançava pendurada na bermuda. Ele contou que era médico e levou-a para sua casa de praia. Fácil.
À segunda vista, ela descobriu. Ela nunca esqueceria aquele dia. Ele tinha acabado de se separar. Ele contou que a mulher levou o carro e a casa de praia e que boa parte do seu salário foi para a pensão dos filhos. Ele usava a mesma bermuda preta. À segunda vista: Adidias. Revelou-se um legítimo homem Adidias.
Mas agora não tinha mais jeito, seu destino já havia sido traçado desde o início nas linhas daquela bermuda. O conto de fadas terminou. E eles foram felizes para sempre: a felicidade, quando se é hipermetrope, também é fácil.

sábado, 25 de agosto de 2007

Meninas, eu li!

Por B. de Quatre


Agora é moda menininhas escreverem livrinhos floreando as suas vidinhas. Comprar pão na esquina ou dar uma mijadinha já garantem um livro, Dias Gomes que o diga. Mas para isso você precisa ser filha de alguém, ter bons amigos ou ser diferente. (Leia-se: ter tatuagens, piercings e cabelo vermelho). Se é moda, é legal. Se é legal, tamos aí! Mas, me desculpem garotinhas, se é moda eu prefiro Paris! Eu prefiro Hell. Se é Paris, é legal. Se é legal, eu leio.

“Não vim segurar a pena para descrever a existência de gente pobre e feia: em primeiro lugar, não sei nada a respeito, em segundo, esse não é um tema dos mais divertidos”. “Sou francesa e parisiense e estou me lixando para o resto; pertenço a uma única comunidade, a mui cosmopolita e controversa tribo Gucci Prada – a grife é meu distintivo”. Essa garota é das minhas! Como vocês vêem, a vida de Hell não precisa ser floreada. Ela é linda, muito rica, mora em Paris (no 16º Arrondissement, isso é que é chique), esquia em Saint-Moritz, faz compras em Milão e janta em um iate em Saint-Tropez. Tudo isso, claro, usando Gucci, Dior e Prada. Quem precisa de mais? A pobre da Hell precisa. Precisa de Prozac. Precisa de alguém que a ame. Precisa de um sentido para a sua vida. E outras futilidades do tipo. A garota começa esbanjando graça e beleza e no final quer cuspir na boate em que dançou. Isso não se faz!

Gente! Nesse livro a Lolita Pille revela todos os podres da alta sociedade francesa. Drogas, dinheiro sujo, surubas, consumismo e depressão. Está tudo lá. Nada que a gente já não saiba, é verdade. Mas, mesmo assim, dizem por aí que depois do livro ela passou a ser rejeitada pelos amigos e proibida de entrar em algumas boates. Bem feito para você, queridinha! Quem mandou querer dar uma de Mister M.?


Ps: Esse livro me rendeu uma cicatriz no meio da testa. Nada mais chique do que uma cicatriz na testa causada por um livro francês. Literalmente, um livro marcante.



Resenha de PILLE, Lolita. Hell.Rio de Janeiro: Intrínseca, 2003.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

VERMICIDA

Por Rodrigo Lopez-Balthar


O Prurido irritante prolifera rente ao ânus. Pensava-ele operar a chaga, algo que acabasse com o raspar de dedos na pele. Um médico dissera-lhe um dia, “vire um platelminto se isso o incomoda tanto”, mal sabia ele que o cu não era o problema, era o sangue que não prestava. Descobriu em casa mesmo sem discurso de doutor algum sua cura, bastava olhar-se no espelho. O diagnóstico foi de uma precisão hipocondríaca: amarelo quase verde. Fez um corte fundo no rego, sangria para se livrar do mal.

sábado, 18 de agosto de 2007

É Refresco

Por B. de Quatre

Eu não tenho nada a lhe oferecer a não ser olhinhos verdes, boquinha carnuda e bundinha durinha. Você quer ser meu amigo? Eu não tenho nada a lhe oferecer a não ser um link lá no meu blog, também posso falar você é gente boa. Posso dizer que seus livros são ótimos, mesmo não tendo lido nenhum.Você quer ser meu amigo? Seja meu amigo! Por favor! A gente pode até formar um grupo novo feito Balão Mágico, embora eu prefira o Trenzinho da Alegria. Você quer ser meu amigo?
Quem tem amigos tem tudo. E quem não tem amigos? Quem não tem amigos não tem livro resenhado e divulgado em revista. Não ganha concurso literário. Quem não tem amigos não é comentado. Quem não tem amigos não é visto, lido ou falado. Papai e mamãe não acessam a net. Quem vai dizer que eu sou bonito e legal? Fica combinado assim: eu lustro o seu espelho e você lustra o meu. Eu entro no seu e depois você entra no meu. Não esquece de espalhar por aí o quanto foi bom.Você arma a minha barraca e eu ajudo você a armar o seu circo. Atirar-se de um trapézio sem rede é muito perigoso. Principalmente quando se é amador. Portanto, modere os comentários. Seus amigos te aparam. Quem não tem amigos não tem blog divulgado em jornal. Pode até ser um diariozinho cor-de-rosa onde uma menininha fala de seus medos, não importa. Tá lá num jornal extremamente criterioso. Uma mão lava a outra e as duas puxam o saco. Esse é o critério. É tão triste não ter amigos! Quem não tem amigos, ou tem uma lista muito restrita, fica até sem assunto para uma revista. E sai por aí feito disco arranhado cantando glórias.... Se tá ardendo é porque tá entrando. Manda um amigo seu passar vaselina. Eu posso assoprar, mas você vai ter que me prometer que vai ser meu amigo....

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Buganvílias

Por Carol Medrado


"Buganvílias derramavam-se sobre os muros, viçosas e vermelhas [...] aquela era a planta favorita dela, as folhas brilhantes e finas como papel escondendo suas florezinhas brancas”. Na frente da minha casa tinha uma buganvília, seus galhos cheios de espinhos roçavam à noite na janela do meu quarto e me deixavam com medo. Foi assim que a buganvília ficou representada na minha infância: a beleza que me paralisava, que me assustava e que podia me ferir. E é como buganvílias que eu vejo as mulheres de Mary Anne Mohanraj em Corpos em Movimento. Como a planta de flores viçosas e vermelhas, com folhas brilhantes e finas como papel, mas dotada também de espinhos camuflados pelos cachos de flores. O livro é publicado no Brasil pela editora Rocco e faz parte da coleção Safra XXI que se propõe a apresentar novos autores. É o primeiro livro da autora que nasceu no Sri Lanka e passou a maior parte da vida nos Estados Unidos.

A obra conta as histórias de duas gerações de famílias do Sri Lanka, os Kandiahs e os Vallipurams, que emigram para os Estados Unidos. As histórias dos membros dessas famílias são contadas em forma de contos que, apesar do desenvolvimento histórico, podem ser lidos sem uma seqüência linear. O livro é dividido em seis partes: primórdios, os Kandiahs, interlúdio, os Vallipurams, os filhos e epílogo. Nos “primórdios” são exploradas as vidas dos integrantes das primeiras gerações dessas famílias e suas emigrações. A história “Sete copos d’água”, que está nesta parte do livro, é a que eu considero como a melhor do livro. Fala do relacionamento amoroso entre uma mulher recém-casada e sua cunhada e merece essa menção pela forma como Mohanraj desenvolve a sexualidade de ambas: você acaba descobrindo maneiras alternativas de se matar a sede. O “interlúdio” é interessante por tratar do conflito entre a etnia tâmil e singalesa no Sri Lanka. Contudo, a melhor parte do livro é “os filhos” que se destaca pelo domínio de Mohanraj em criar enredos que abordam a sexualidade. Os melhores contos/capítulos sobre esse assunto estão nessa parte do livro como: “Corpos em Movimento”, “Minal no Inverno” e “Madeira e Carne”. Pelo mesmo motivo vale a pena ler o conto “Pedaços do Coração”.

É marcante no livro a predominância do feminino que se apresenta com uma fachada de beleza, fragilidade e submissão. Essa é a condição que a cultura singalesa, de casamentos arranjados e de mulheres que usam sáris, impõe a elas. Porém, as mulheres de Mohanraj, embaixo de suas flores viçosas e folhas frágeis, se rebelam e encontram um equilíbrio entres seus desejos e suas condenações. São mulheres capazes de induzir o aborto do filho de um marido que não amam ou de matar delicadamente o pai de sua filha que representa uma ameaça para a garota. A questão da adaptação cultural também é explorada no livro. Em contato com uma cultura tão diferente os personagens têm que encontrar uma maneira de preservar suas origens e incorporar o novo, nem que seja comendo purê de batatas com pimenta vermelha. Ou fazendo com que o Ramayana ganhe uma versão americana e contemporânea.


Resenha de MOHANRAJ, Mary Anne. Corpos em Movimento; tradução de Lea Viveiros de Castro. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.

...ele vai te pegar

" A palavra 'tengu' é originária de chinês 'tien-kou', que significa 'cão celestial'. Os tengus povoam os mitos e a imaginação dos japoneses. O senso comum classifica-os meramente como 'demônios da montanha'. Essas personificações arquetípicas originaram uma série de interpretações e descrições a respeito dos Tengu que, não raro, são retatados como 'goblins', monstros ou ciaturas mágicas. No Japão, ao invés do bicho-papão, são contadas às crianças estórias de tengu, que as perseguiriam".

In: O Dedo do Imperador e outros contos japoneses, tradução de Rodrigo Manzano. São Paulo: Landy, 2005

domingo, 12 de agosto de 2007

Lobo Antunes

Por Rodrigo Lopez-Balthar


Martillo y cinzel. Dentro de uma pedra há um cavalo. Com martelo, cinzel e sonho se faz com que uma pedra se transforme em uma escultura. A cabeça de um homem pode transformar o informe barro em outro homem-barro seu semelhante imóvel. É assim que vejo António Lobo Antunes: um escultor de palavras.
Sua leitura é um passeio em campo onírico de esculturas, a linguagem esculpida, tomando forma no amor, na dor, na angústia e no desespero. Uma leitura de maioridade, demorada, sem a pressa bestselleriana; com ritmo próprio, determinado pelo autor. Cuja visão cruel do homem está além da experiência imediata com a guerra - vivida por ele e relatada em Os Cus de Judas - inscreve-se em nossos atos cotidianos mais comuns, na nossa pequena guerra chamada vida.


Pequeno Extrato:


"Talvez que quando eu for velho, reduzido aos meus relógios e aos meus gatos num terceiro andar sem elevador, conceba o meu desaparecimento não como o de um náufrago submerso por embalagens de comprimidos, cataplasmas, chás medicinais e orações ao Divino Espírito Santo, mas sob a forma de um menino que se erguerá de mim como a alma do corpo nas gravuras do catecismo, para se aproximar, em piruetas inseguras, do negro muito direito, de cabelo esticado a brilhantina, cujos beiços se curvam no sorriso enigmático e infinitamente indulgente de um buda de patins".


Antônio Lobo Antunes. Os Cus de Judas. Rio de Janeiro: Objetiva/Alfaguara, 2007.

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

A Filha de Freud: uma historinha infantil

Por Carol Medrado

Para Igor e Adriana



O Tigrão era o brinquedo favorito da Aninha. Em todas as suas diversões, lá estava o Tigrão. Ela adorava brincar de casinha com ele, no esconde-esconde e no pega-pega ele também era imbatível. Mas sua brincadeira mais legal com ele era a de sobe e desce. Essa era a preferida da Aninha. Chegou o Natal e Aninha ganhou outro grande amigo de presente, um bichinho de pelúcia que ela chamou de Roxinho. Ela também gostava muito do Roxinho, mas ele não conseguiu tomar o lugar do Tigrão. Aninha estava muito feliz com seus dois amiguinhos, os três brincavam juntos o tempo todo. É uma pena que a felicidade de Aninha fosse durar tão pouco. Um dia, ao voltar da escola, Aninha pega o Tigrão em flagrante brincando de sobe e desce com o Roxinho. Que coisa feia! Tadinha da Aninha! Ela descobriu precocemente que os homens, mesmo os de pelúcia, não são nada confiáveis. Desde então ela passou a brincar apenas com suas Barbies.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Leitura Acessível


“Comprei” o livro Contos de Amor Rasgado de Marina Colasanti na Bienal do Livro da Bahia desse ano, acabei não pagando nada por ele pois o valor cobrado na entrada dava direito a três reais de desconto na compra de livros, justamente o preço do livro de Colasanti. Adquiri um livro novo e ótimo por um preço acessível. O livro é composto por pequenos contos cujo tema principal é o amor. O lirismo e o humor presente nos contos fazem com esteja entre as minhas melhores leituras do ano. Selecionei os contos que mais gosto entre os menores do livro:

Conto em Letras Garrafais

"Todos os dias esvaziava uma garrafa, colocava dentro sua mensagem, e a entregava ao mar. Nunca recebeu resposta.
Mas tornou-se alcoólatra. "

Prova de Amor

"'Meu bem, deixa crescer a barba para me agradar', pediu ele.
E ela, num supremo esforço de amor, começou a fiar dentro de si, e a laboriosamente expelir aqueles novos pêlos, que na pele fechada feriam caminho.
Mas quando, afinal, a doce barba cobriu-lhe o rosto, e com orgulho expectante entregou sua estranheza àquele homem: “Você não é mais a mesma”, disse ele.
E se foi. "

Uma Questão de Educação

"Viu sua mulher conversando no portão com o amante. Não teve dúvidas. Quando ela entrou, decapitou-a com o machado. Depois recolheu a cabeça e, antes que todo sangue escapasse pelo pescoço truncado, jogou-a na panela. Picou a cebola, os temperos, acrescentou água, e começou a cozinhar a grande sopa.
Pronta, porém, não conseguiu comê-la. Ânsias de vômito trancavam-lhe diante do prato macabro. Nunca, desde pequeno, suportara a visão de cabelos na comida. "

De fato, uma mulher preciosa

"Adoeceu a mulher. Bebia água, banhava-se com leite, recusava a comida, e não saía da cama. Entre as coxas, por vezes, uma baba irisada escorria, secando sobre a pele.
Passado algum tempo, quis penetrá-la o marido, há muito ausente daquele corpo. Mas adentrando nas carnes, sentiu o impedimento. Então, retirando-se dela, mergulhou os dedos em pinça, e no fundo, além de pétalas e pistilo, rodeada de mucosas palpitantes, pescou, úmida, a pérola. "


Resenha de COLASANTI, Marina. Contos de Amor Rasgado. Rio de Janeiro: Rocco, 1986.

domingo, 5 de agosto de 2007

A sublime diferença

Por Rodrigo Lopez-Balthar


Não havia mais espaço. No intento de ser diferente só lhe restara uma alternativa. Acabou virando notícia: - Bicha fatiadora de bosta bota piercing no meio do cú.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Onívora faminta

Por Carol Medrado

Solteirona anuncia:

“Compro codorna macho.”

Descobriu que a codorna chega a medir 23 centímetros, vive em campos ralos, adquire forma ereta, esconde-se em buracos e que o macho é capaz de matar a fêmea de tanto cruzar. A única coisa que a prendia à vida era o amor aos animaizinhos...

A Gorda

Por Rodrigo Lopez-Balthar


Cara de doida. Olhos de maluca denunciando a loucura. Esbugalhados. Ninguém lhe avisa que é doida, um dia enforca os filhos e todos se perguntarão "como foi que isto aconteceu?". Ela entrou na sala e começou a apresentar seu trabalho, tranqüila. Eu a observava com medo, sempre tive medo dela. De repente um estalo. Um sorriso em meu rosto. Um bilhete, que ninguém tinha prestado atenção jazia junto ao corpo: "Preciso que todos me amem".

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Latindo em Outro Quintal

"Resenha sobre o Pequenas Catástrofes
Olha só, ma[i]s uma resenha porreta sobre o PC (Pequenas Catástrofes). A Carol Medrado, do Blog, "O Cão Celestial", escreveu sobre o livro do tio Pablo. Leitura certeira, bem no centro da narrativa, que é o que importa. Valeu Carol! E visitem a página!" em 01/08/2007.
Pablo Capistrano viu, leu, gostou e publicou em seu site a resenha feita por Carol Medrado de Pequenas Catástrofes, seu livro lançado pela Editora Rocco. A postagem original está mais abaixo, mas quem quiser conferir no site dele acesse aqui.

Mega Mega Mega



Por B. de Quatre

Ai, gente, encontrei minha alma gêmea! Pena que eu não goste dessa fruta. Estou tão emocionado, meu Deus! Ela também gosta de Poliana, de Ghost, de Legalmente Loira e de Mr Rollan. Ela é fofinha que nem eu e o melhor de tudo é que ela é uma grande intelectual, escritora, professora universitária. Ela é incrível! Ela é ultra! Que mulher! Se eu fosse mulher eu teria inveja dela, ai, gente, eu tenho inveja dela! Para completar ela ainda é a autora de um dos meus livros favoritos (eu já falei dele aqui). Ela é hiper! Acho até que vou pintar meus pêlos de loiro para ficar mais parecido com ela. Que emoção! E o mais incrível é que ela é uma pessoa super simples, modesta. Ela é super! Meu Deus, ela é perfeita! Gata, eu tô na sua! Você é demais! Você é mega, mega, mega, megalo....