terça-feira, 24 de julho de 2007

Fractais

Por Carol Medrado


Eu não entendo nada de filosofia e nem de música. E minha “viagem” sempre partiu da literatura. Por isso posso ter perdido algumas referências importantes para entender o livro Pequenas Catástrofes de Pablo Capistrano. Tive uma certa resistência inicial ao livro por causa disso, mas resolvi jogar pra cima e terminar de lê-lo. Ainda bem. Algumas peças ainda não encaixaram. E é o que me faz achar que eu entendi a história: o livro é um jogo de desencaixe. Sai da caixa, sai do centro e se possível sai do ego ou da persona. Explore a sombra.
O livro conta a história de um professor universitário que reencontra, muitos anos depois, um amigo de infância. O nome do amigo é Demian. Não vou dar o segredo do cofre, cabe dizer apenas que seria interessante ler Demian de Hermann Hesse, assim como ler Nietzsche e Wittgenstein e ouvir a trilha sonora do livro. O Demian de Capistrano é fotógrafo e por isso viajou o mundo todo. Foi durante as suas viagens que ele conheceu o Projeto Zaratustra em que pretende “iniciar” o personagem principal. O Projeto Zaratustra é uma mistura de ciência e religião no qual seus “adeptos” crêem que através do uso de uma droga chamada tetrapharmakon podem provocar a própria evolução e ter contato com Deus. É com o intuito de realizar essa iniciação que os dois viajam para a Europa. É a partir daí que começam as “pequenas catástrofes”? Eu acho que o personagem diria que não, as catástrofes já estão aí, já aconteceram e continuam acontecendo. Basta se atentar à revisão histórica que o personagem faz em sua viagem a Europa. Nessa viagem, que começa pela Alemanha, o personagem rememora a história de seu povo, os judeus, desde as perseguições anteriores às cruzadas até o holocausto. Continuando a viagem os dois chegam até a Grécia, onde será feito o ritual de iniciação. Nesse ritual ele usa o tetrapharmakon e passa cinco dias “suspenso” sobre o efeito da droga. Quando o efeito passa, ele não consegue se lembrar de nada e se vê num quarto de hotel ao lado de mulher que conheceu na viagem, Helena. É a terceira (?) Helena de sua vida, sua mulher e a mulher de Demian tem o mesmo nome. Parece até Manoel Carlos, né? Mas o nome, como tudo nesse texto, não é à toa. Como disse antes, não darei os segredos do cofre. De volta à realidade, ele tem que conviver com o mistério do que aconteceu nesses cincos dias de “ausência” e do que ocorreu entre ele e essa Helena. Nos preparativos de volta para casa ele descobre qual a real intenção de Demian ao procurá-lo: ele acaba sendo usado para levar uma mala cheia de tetrapharmakon para o Brasil. Chegando à Natal ele percebe que não passou incólume ao uso da droga, sendo acometido por pequenas crises de “ausência”. Quando é que começaram as “pequenas catástrofes”? Impossível dizer. O que sei é que a partir de então o personagem se perde totalmente, não tendo controle nem resposta nenhuma sobre a sua própria vida. Onde está Deus? Onde está a verdade? Onde eu estou? No final também acabei perdendo as minhas certezas e referências. Sentia-me como a imagem da capa do livro, entrando em caixinhas cada vez menores, cada vez menores, cada vez menores... sem saber onde tudo começou. Quem segura a caixa? Alguns podem dizer que é Deus. Eu prefiro dizer que é o próprio Capistrano.

Resenha de CAPISTRANO, Pablo. Pequenas Catástrofes. Rio de Janeiro: Rocco, 2005.

3 comentários:

Rynaldo Papoy disse...

Pô, vocês criticam as coisas que sou especialista... ahahaha.

Abraço.

Anônimo disse...

Na verdade a resistência é por não ter domínio suficiente

Anônimo disse...

Na verdade é presunçoso demais dizer na verdade.